As palavras são boas. As palavras
são más. As palavras ofendem. As palavras pedem desculpas. As palavras queimam.
As palavras acariciam. As palavras são dadas, trocadas, oferecidas, vendidas e
inventadas. As palavras estão ausentes. Algumas palavras sugam-nos, não nos
largam... As palavras aconselham, sugerem, insinuam, ordenam, impõem, segregam,
eliminam. São melífluas ou azedas. O mundo gira sobre palavras lubrificadas com
óleo de paciência. Os cérebros estão cheios de palavras que vivem em boa paz
com as suas contrárias e inimigas. Por isso as pessoas fazem o contrário do que
pensam, julgando pensar o que fazem. Há muitas palavras... (...) E tudo isso
atordoa as estrelas e perturba as comunicações, como as tempestades solares.
Porque as palavras deixaram de comunicar. Cada palavra é dita para que se não
ouça outra palavra. A palavra, mesmo quando não afirma, afirma-se. A palavra
não responde nem pergunta: amassa. A palavra é a erva fresca e verde que cobre
os dentes do pântano. A palavra é poeira nos olhos e olhos furados. A palavra
não mostra. A palavra disfarça. Daí que seja urgente moldar as palavras para
que a sementeira se mude em seara. Daí que as palavras sejam instrumento de
morte - ou de salvação. Daí que a palavra só valha o que valer o silêncio do
ato. Há também o silêncio. O silêncio, por definição, é o que não se ouve. O
silêncio escuta, examina, observa, pesa e analisa. O silêncio é fecundo. O
silêncio é a terra negra e fértil, o húmus do ser, a melodia calada sob a luz
solar. Caem sobre ele as palavras. Todas as palavras. As palavras boas e as
más. O trigo e o joio. Mas só o trigo dá pão.
José Saramago
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